abril 19, 2007

Pela imagem todos sofremos os abusos mundanos...

Sorrateiramente bicou a porta dos fundos para adentrar a festa que nunca fora convidado. Serviu-se na sala das melhores entradas e petiscos... Bebida, como havia de sobra, pode experimentar, em doses altas e completas, para nunca mais esquecer dos sabores. As risadas dos outros em nada interferia no seu próprio gozo. Sentia-se, mesmo ali sendo alvo das maiores balbúrdias, um ser-humano realizado. Após o jantar e das diversas bebidas experimentadas, foi o álcool que ditou a sua conduta festiva. Cantou músicas de sua infância e dancinhas típicas dos quatro cantos do mundo... Nesta hora as risadas se transformaram em tensas gargalhadas, com toses e pegadas de ar... Alguém até se aproximou e filmou a cena... Com mais algumas doses, se virou ao seus pensamentos... Lágrimas surgiram na sua face, brotou uma estranha e perversa tristeza... Sem falar nada foi meditar na cozinha... Roubou um livretinho e escreveu... Suas angústias, dúvidas, amores e pensamentos... Lotou o livreto... Deixando-o para trás foi para casa aos prantos... Uma daquelas pessoas que riram, pegou o livreto e leu para os convidados reais... As gargalhadas foram transformadas em espanto, em brilhos e, para os mais sensíveis, pequenas lágrimas... A grafia era vivida e perfeita, sem rimas mas ritmada pelo mais belo sentimento... Tentaram, em vão, achar o sujeito... Sem nome e só com as palhaçadas feitas... Era essa a imagem que todos tinham... E nunca imaginariam que era um poeta...

abril 14, 2007

Sobre a incapacidade de amar para sempre...

Tratou os trapos com carinho e destreza, esquecendo dos defeitos e sujeiras que possuíam e concentrando-se na forma. Imaginava os caminhos por onde tinham passado, as frestas que percorreram e quantos não agregaram. Alguns novos e tristes, outros velhos e felizes, outros simpáticos, outros emburrados... Porém, ainda, trapos. De tanto estudar e admirar fez-se a filosofia do trapo. Sem uso ou denotações... Simplesmente o nome para o trabalho de meses de estudo. Como era muito homogênea e carente de novidades, perdeu o interesse... Não tinha mais o brilho do fascínio nos olhos e muito menos a vontade de desenhar formas na sua mente... Como tudo na vida, morreu o desejo abstrato por trapos. Continuou usando-os diariamente, para as mais simples tarefas... E com um pouco mais de tempo, esqueceu completamente que criara a Filosofia... E em um belo dia de almoço familiar, pegou-se fascinado pelos guardanapos... Bradava pela singularidade, forma e maciez... Fez-se então um novo amor, a partir daí... Pisou nos trapos, acabando com a vida que ele mesmo criara.